O Globo: Atuação de procuradores-gerais é questionada
Deputados e integrantes do MP acham que direito de governadores de não escolher o mais votado enfraquece investigações
SÃO PAULO - Quase um terço (oito) dos atuais procuradores-gerais de Justiça do país chegou pela primeira vez ao cargo sem ter sido o mais votado na eleição interna do Ministério Público. Frente a esse quadro, a possibilidade de os governadores escolherem o nome daquele que poderá ou não investigá-los tem colocado a atuação dos chefes do MP em xeque. Há casos de engavetamento precoce de inquéritos, falta de iniciativa em assuntos sensíveis aos governos estaduais e omissão em relação a contratações irregulares.
Pela Constituição, o procurador-geral é a única autoridade que pode propor ação civil contra governadores, presidentes de assembleias legislativas e tribunais de justiça. A escolha do ocupante é feita pelo governador a partir de uma lista tríplice formada em uma eleição interna do MP, e ele não é obrigado a escolher o mais votado, o que tem levantado suspeitas sobre a atuação dos procuradores em vários estados.
Em Minas, os deputados Rogério Correa (PT) e Sávio Souza Cruz (PMDB) abriram uma representação em maio deste ano contra o procurador-geral Alceu José Torres Marques no Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), acusando-o de não investigar repasses do governo a empresas de comunicação que têm integrantes da família do ex-governador e senador Aécio Neves (PSDB) como sócios. Há pelo menos um ano, os parlamentares pediam ao procurador-geral que investigasse o tema, especialmente as atribuições do Núcleo Gestor de Comunicação Social do Governo do Estado, coordenado pela irmã de Aécio, Andrea Neves, sócia nas empresas de comunicação. Alceu não levou o procedimento adiante.
No início de 2010, Alceu prometeu encerrar em seis meses investigação criminal sobre abusos cometidos por deputados estaduais no uso da verba indenizatória, mas a apuração ainda se arrasta. No início de 2011, ele também se recusou a investigar manobra do então presidente da Assembleia Legislativa de Minas e atual vice-governador, Alberto Pinto Coelho (PP), para reembolso de gastos maiores que o permitido em restaurantes de luxo da capital.
Alceu assumiu pela primeira vez em 2008, pelas mãos do então governador Aécio Neves, apesar de ter ficado em segundo na lista. Foi reconduzido em 2010 por Antonio Anastasia (PSDB), como primeiro da lista. Ele disse que só se pronunciará ao CNMP.
No Maranhão, o primeiro lugar na votação interna em 2010, o procurador Raimundo Nonato foi preterido pela governadora Roseana Sarney, que preferiu indicar ao cargo Maria de Fátima Cordeiro, segundo lugar. Em outras ocasiões como procurador-geral de Justiça, Nonato determinou ações de fiscalização em secretarias e causou antipatia junto ao governo e empresários.
- Para ser escolhido, o candidato tem que fazer arranjos internos. De todo modo, o PGJ estaria mais livre para agir se não fosse indicado pelo chefe do Executivo. O fiscalizador não pode ser devedor do fiscalizado - disse o procurador de Justiça maranhense José Henrique Marques Moreira.
O deputado Marcelo Ramos (PSB), do Amazonas, reclamou que, apesar de sucessivos escândalos, nenhuma ação de improbidade foi apresentada pelos procuradores-gerais que passaram nos últimos anos pelo cargo.
- Quando representamos e os processo não viram ações judiciais, credito isso à falta de independência do MP - disse o deputado, que denunciou irregularidades na construção de um monumento e a contratação de professores temporários pelo governo estadual
Primeiro colocado da lista por duas vezes, o procurador Francisco Cruz não foi escolhido em anos anteriores porque não tinha boas relações com o governador Eduardo Braga (PMDB). Só chegou ao cargo em 2010, quando outro governador assumiu e ele ficou em segundo lugar na lista tríplice.
- Sempre defendi eleição direta, sem interferência de outro poder - disse Cruz, que negou má vontade com pedidos de investigação.
No Rio Grande do Sul, segunda colocada na eleição do MP em 2009, Simone da Rocha foi nomeada pela governadora Yeda Crusis (PSDB). Durante a crise da gestão Yeda, ela foi causada por petistas de arquivar representações contra o governo. No ano passado, ela concorreu à reeleição e foi a primeira colocada, mas o governador era o petista Tarso Genro, que escolheu o segundo da lista, Eduardo de Lima Veiga. Simone também tem um histórico de ações contra a atuação do MST no estado.
- Encaminhei todas as representações. O resultado depende de avaliação - disse Simone.
Em São Paulo, em abril, o governador Geraldo Alckmin escolheu o segundo mais votado na lista tríplice, Marcos Elias Rosa. O caso acarretou uma divisão dentro do Ministério Público.
- Ficou claro que o governo quis alguém dócil. Não estou dizendo que quem foi escolhido é ou será dócil - afirmou Saad Mazloun, da Promotoria do Patrimônio Público de São Paulo.
Até quando o primeiro colocado da lista é indicado há suspeitas. É o caso do procurador-geral de Justiça Benedito Torres, nomeado pelo governador de Goiás, Marconi Perillo, que aparece nas conversas entre o senador Demóstenes Torres (sem partido-GO), irmão do procurador, e Carlinhos Cachoeira. Os diálogos gravados durante a Operação Monte Carlo da Polícia Federal mostram Cachoeira solicitando a Demóstenes que interceda junto ao irmão em favor de interesse de seus negócios. O procurador-geral nega envolvimento com a quadrilha.
(*) Matéria publicada no jornal O Globo, de 11/06/12, página 9.
MP-AM faz balanço das ações propostas contra prefeitos no primeiro semestre de 2012
Dentre as várias atribuições do Ministério Público do Estado do Amazonas na defesa dos direitos da coletividade, está o oferecimento de denúncia criminal contra gestores públicos por irregularidades cometidas durante o exercício de mandato, como, por exemplo, a má aplicação do dinheiro público, desvio de verbas e superfaturamento de obras. A Subprocuradoria-Geral de Justiça para Assuntos Jurídicos e Institucionais do MP-AM fez um balanço dos processos em tramitação no Tribunal de Justiça, enviado neste primeiro semestre de 2012.
Boca do Acre, Canutama, Pauini, Eirunepé, São Paulo de Olivença, Tonantins, Ipixuna e Caapiranga são os municípios amazonenses que têm seus gestores municipais sob julgamento da Justiça Estadual. Dentre as principais irregularidades apontadas pelo Ministério Público contra prefeitos do Amazonas estão a não prestação do uso de dinheiro público ou a reprovação das contas das administações municipais, ou seja, infração de artigos do Código Penal, do Decreto-Lei 201/67 ou da Lei Federal nº 8.666/93.
A prefeita de Boca do Acre, Maria das Dores Munhoz, e a prefeita de Pauini, Maria Barroso da Costa, foram denunciadas à Justiça pela não prestação de contas da administração ao Tribunal de Contas do Estado (TCE) dentro do prazo legal, cometendo a infração do art. 1º, inciso VI, do Decreto-Lei 201/67. Os dois processos estão em andamento no TJAM, com movimentações no mês de maio. O prefeito de Canutama, João Ocivaldo de Amorim, também foi denunciado pelas mesmas infrações, e seu processo foi despachado à Procuradoria Geral de Justiça na última segunda-feira, 11 de maio de 2012.
O prefeito do município de Eirunepé, Francisco Dissica Tomaz, além de ter as contas públicas de sua administração (2009) reprovadas pelo TCE, também foi denunciado por difamação contra o Promotor de Justiça da Comarca, cometendo infrações do Decreto-Lei 201/67, do Código Penal e da Lei Federal nº 8.666/93. Os dois processos também tramitam no TJAM, com movimentações de maio de 2012 para o primeiro processo e de março para o processo por difamação.
Os prefeitos de São Paulo de Olivença, Raimundo Nonato Martins, e de Tonantins, Simeão Garcia Nascimento, foram denunciados por deixarem de prestar contas de suas administrações ao TCE dentro do prazo legal. Os processos estão em andamento na Justiça do Amazonas com movimentações datadas de maio de 2012. Já a prefeita municipal de Ipixuna, Ana Maria Farias de Oliveira, foi denunciada por ter as contas da prefeitura (2009) julgadas irregulares pelo Tribunal de Contas Estadual, com infrações do Decreto-Lei 201/67 e da Lei nº 8.666/93.
O prefeito do município de Caapiranga, Antônio Ferreira Lima, foi denunciado pelo Ministério Público por cometer diversas irregularidades, levando prejuízos ao erário municipal. A prefeitura de Caapiranga teve as contas reprovadas pelo Tribunal de Contas, onde foram detectadas múltiplas infrações em obras realizadas no município durante o ano de 2009, que também envolvem o denunciado Flávio Castro dos Santos, proprietário da empresa Construtora de Obras e Serviços F. Castro dos Santos. O processo contra o prefeito de Caapiranga encontra-se em andamento no TJAM, com a última movimentação datada de 11 de junho de 2012.
CNPG participa, em Macapá, de ato de apoio à PGJ do Amapá
O Presidente do Conselho Nacional dos Procuradores-Gerais dos Estados e da União (CNPG), Procurador-Geral de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, Cláudio Lopes, participou em Macapá (AP), nesta terça-feira (12/06), de ato de apoio à Procuradora-Geral de Justiça do Amapá, Ivana Lúcia Franco Cei, que tem sido ameaçada de destituição por parlamentares da Assembleia Legislativa do Estado do Amapá. A manifestação, que reuniu Procuradores-Gerais de Justiça de todo o País, aconteceu durante a abertura da Reunião Extraordinária do CNPG, e foi em apoio às investigações do Ministério Público Estadual e do Federal no Estado, que vêm sofrendo ataques com o intuito de desacreditar e desmoralizar as referidas instituições no exercício de suas funções.
“É absurda a violência contra a Procuradora-Geral de Justiça do Amapá, Ivana Lúcia Franco Cei, e contra o MP brasileiro. É por isso que não se pode subtrair o poder de investigar do MP”, afirmou o Presidente do CNPG, ao se referir à Proposta de Emenda Constitucional nº 37, que tira o poder de investigação do MP e está sendo analisada por Comissão Mista do Congresso Nacional.
O ato de apoio à PGJ do Amapá contou com a presença dos Vice-Presidentes do CNPG para a Região Norte, Procurador-Geral de Justiça do Estado de Rondônia, Héverton Alves de Aguiar; e do Centro-Oeste, Procurador-Geral de Justiça do Estado de Mato Grosso, Marcelo Ferra de Carvalho. Outros Procuradores-Gerais de Justiça também participaram da Reunião Extraordinária: o do Pará, Antônio Eduardo Barleta de Almeida; Ceará, Alfredo Ricardo de Holanda Cavalcante Machado; Paraíba, Oswaldo Trigueiro do Valle Filho; Rio Grande do Norte, Manoel Onofre de Souza Neto; Santa Catarina, Lio Marcos Marin; Sergipe, Orlando Rochadel Moreira; Amazonas, Francisco das Chagas Santiago da Cruz; e Acre, Patrícia de Amorim Rêgo. A Secretária-Executiva do CNPG, Procuradora de Justiça do MP de Pernambuco Maria Helena Nunes Lyra, também compareceu.
O Governador do Amapá, Nilo Capiberibe, esteve presente manifestando apoio à PGJ do Amapá e os Senadores do Amapá, João Alberto Capiberibe e Randolfe Rodrigues, enviaram nota de apoio.
A Reunião Extraordinária foi convocada por Cláudio Lopes, durante a Reunião Ordinária do CNPG, que aconteceu em Palmas (TO), no final de maio. O objetivo do encontro é manifestar apoio à Procuradora-Geral que investiga possíveis atos de improbidade na sede da Assembleia Legislativa do Estado do Amapá. Dentre as supostas irregularidades investigadas, constam o valor da verba indenizatória dos parlamentares, de R$ 100 mil mensais, e denúncias de funcionários e empresas fantasmas prestando serviços para a Assembleia.
Audiência no MP-AM reúne representantes e alunos do curso de Medicina da UEA
De autoria da 56ª Promotoria de Justiça Especializada na Proteção e Defesa dos Direitos Constitucionais do Cidadão (56ª Prodedic), a Audiência Pública realizada na manhã desta segunda-feira, 11 de junho de 2012, reuniu, na sede do Ministério Público do Amazonas, em Manaus, representantes e alunos do curso de Medicina da Universidade do Estado do Amazonas (UEA) com o objetivo de esclarecer as suspeitas de irregularidades denunciadas ao MP-AM, de que alunos em período de estágio estariam sendo submetidos à carga horária extraordinária, em confronto com as regras do Ministério da Educação (MEC), e que tais estágios não estariam sendo supervisionados por uma instituição pública, e sim por uma entidade particular, no caso, o Instituto de Cirurgia do Estado do Amazonas, o ICEA.
Dentre as reclamações sobre carga horária dos estágios, os estudantes disseram que os plantões no Instituto de Cirurgia iniciam as 06:00 horas e terminam as 00:00 horas, o que contabilizaria 90 horas semanais em estágio, ultrapassando a carga horária máxima exigida de 60 horas. Para os alunos, esse ritmo de trabalho durante o estágio supervisionado causa prejuízos como a falta de tempo para estudar e descansar. Outra irregularidade apontada foi o desvio de função durante as 90 horas de estágio, que seriam ocupadas em grande parte pela realização de serviços administrativos ao invés de procedimentos médicos e clínicos. Os estágios em Ortopedia e em Clínica Médica foram os mais citados como aqueles em que os estudantes prestam serviços de "secretariado".
Outro ponto negativo levantado pelos acadêmicos foi a escassez de professores e a existência de "professores fantasmas" nos estágios de Anestesiologia e Cirurgia Abdominal na Fundação Hospital Adriano Jorge (FHAJ). Segundos os universitários, os estágios são supervisionados apenas por residentes, e não por preceptores ou professores, o que prejudicaria o aprendizado completo de procedimentos médicos. Conforme os depoimentos, são os profissionais do Icea que acabam acompanhando os alunos em alguns estágios, e estes não possuem comprometimento e nem preocupação com o ensino no curso por não serem vinculados à UEA. Um aluno declarou que durante três meses de estágio em Anestesiologia no Hospital Adriano Jorge, o preceptor da disciplina não compareceu nenhuma vez para acompanhar os alunos.
O 2º Secretário do Conselho Regional de Medicina, Antônio de Pádua Ramalho, também presente na Audiência Pública, disse que durante os estágios os estudantes só podem estar sob a supervisão de médicos quando houver um instrumento formal de habilitação, ou se esses profissionais da saúde estiverem formalmente vinculados a projetos da UEA e/ou por meio de termo de cooperação. Para Antônio Ramalho, é importante que seja verificado se não há a exploração de mão de obra dos estudantes, como o desvio de função e o excesso em carga horária.
As reclamações de alguns alunos sobre o estágio em Ortopedia junto à Fundação Adriano Jorge foram confirmadas pelo representante do Centro Acadêmico de Medicina, Sebastião Bezerra Campos, também presente na audiência. Ele afirmou também outro problema no estágio do curso: o descumprimento da carga horária total mínima e necessária em estágio para a conclusão do curso, ou seja, menos de 60 horas, que, segundo ele, se explicaria pela falta de professores para algumas disciplinas, como os estágios de Ginecologia/Obstetrícia. Com o propósito de encontrar solução para os problemas apontados, um aluno chegou a sugerir a mudança da grade curricular do curso de Medicina.
De acordo com a Assessora Técnica da UEA, Tânia Maria Camargo, "pode haver algumas relações que não são próprias do estágio". Em seu depoimento, ela disse que a Universidade está começando a rediscutir e atualizar o Plano Pedagógico do curso de Medicina, e justificou que os maiores problemas nos estágios dizem respeito a "questões estruturais de políticas públicas". Tânia Maria informou que a UEA está trabalhando para que a quantidade de alunos do curso de Medicina aumente em hospitais e casinhas da saúde, e também em toda rede de saúde estadual.
Contrariando as declarações dos estudantes, o coordenador do curso de Medicina da UEA declarou que desconhece qualquer demanda quanto ao Icea. A Procuradora Chefe da UEA, Indra Mara Bessa, também afirmou que os estudantes de Medicina não prestam estágio ao Icea, pois essa entidade é uma empresa terceirizada e que não contrata estudantes. Segundo Indra Bessa, a UEA não possui relação com o Instituto de Cirurgia, e sim possui convênio com a Secretaria de Estado de Saúde (Susam), a qual tem o comprometimento de disponibilizar profissionais para trabalhar junto aos estudantes em estágios nas Unidades de Saúde.
Entretanto, Indra Bessa informou que a falta de professores para algumas disciplinas de estágio no curso de Medicina na UEA se justifica na impossibilidade de existir, dentro da rede de saúde do Estado, professores (equipes médicas) em todas as especialidades. A Procuradora Indra Bessa confirmou ser possível, em alguns momentos, que o procedimento cirúrgico, durante o período de estágio, se estenda em tempo superior à carga horária inicialmente acordada, mas que a UEA não entende isso como uma prática ilegal no tocante à carga de 60 horas.
Para o Promotor de Justiça Mirtil Fernandes, o curso de Medicina é extremamante prático, portanto, as falhas tem que ser corrigidas para que os alunos possam ser bons profissionais. O Ministério Público do Estado vai solicitar da UEA a lista nominal e a lista de presença dos professores que não estão cumprindo a carga horária nos cursos de estágio, a fim de que seja apurada a responsabilidade de tais profissionais.