Entrevista com a Promotora de Justiça Lílian Maria Pires Stone
A Promotora Lilian Stone falou ao Portal do MP-AM sobre sua carreira, da passagem pelo interior do Amazonas e da dedicação ao Ministério Público. Confira.
AIDC: Quais as Comarcas pelas quais já passou?
Entrevista com o Promotor de Justiça Edílson Queiroz Martins
O Promotor de Justiça Edílson Queiroz Martins é titular da 77ª Promotoria de Justiça de Patrimônio Público. Ele fala sobre sua carreira no Direito desde os tempos em que residia no Rio de Janeiro, o longo período de atuação nas Comarcas do interior do Amazonas e os atuais trabalhos de defesa do erário público e da moralidade administrativa desenvolvidos na 77ª PRODEPP. Edilson Queiroz também foi Presidente da Associação Amazonense do Ministério Público e Subprocurador-Geral de Justiça para Assuntos Administrativos.
AIDC: Como foi o início da sua profissão na área do Direito??
Me formei como Bacharel em Direito em 1988, em plena promulgação da Constituição Federal, na Universidade Estácio de Sá no Rio de Janeiro. Fui advogado militante nos municípios da baixada fluminense: Caxias, Nova Iguaçú e Nilópolis, onde adquiri experiência no ofício do Direito. Nessa militância aprendi que o Direito é uma coisa e a Justiça é outra.
AIDC: Há quanto tempo atua como Promotor de Justiça no Ministério Público amazonense? Fale sobre essa trajetória.
Ingresssei no Ministério Público do Amazonas em 18 de julho de 1990, minha primeira Comarca foi Santa Isabel do Rio Negro, onde exerci as funções de Promotor de Justiça por quatro meses, sendo logo removido para a Comarca Maués, no médio Amazonas. Em Maués fiquei residindo e atuando no município até outubro de 1996, sendo posteriormente promovido para Capital por antiguidade, para a 57ª Promotoria de Justiça Especializada na Proteção e Defesa dos Direitos dos Cidadãos, onde permaneci como titular até dezembro de 2010. Nesse período, no entanto, de fevereiro de 2003 a fevereiro de 2005, fui Presidente da Associação Amazonense do Ministério Público (AAMP), e de outubro de 2008 a outubro de 2010 exerci o honroso cargo de Subprocurador-Geral de Justiça para Assuntos Administrativos. Por fim, de janeiro de 2011 até o momento sou titular da 77ª Promotoria de Justiça Especializada na Defesa do Patrimônio Público.
AIDC: Ser um Promotor de Justiça sempre foi sua meta ou pensou em exercer outra atividade profissional?
Ser operador do Direito sempre foi meu objetivo e minha aptidão natural. Na verdade me preparei para ser advogado, pensava em atuar na advocacia privada, no entanto, a vida me trouxe para o Direito Público, com efeito, para o Ministério Público do Amazonas onde tive a oportunidade de voltar para casa e me realizar como pessoa e profissional do labor jurídico.
AIDC: Fale sobre a sua atual Promotoria. Quais os casos mais frequentes e como deve agir hoje um promotor da área de Patrimônio Público?
As Promotorias de Defesa do Patrimônio Público, as PRODEPPs, com são conhecidas, são órgãos recém criados e instalados com menos de cinco anos. Ainda estamos em fase de estruturação técnicas e material para o desempenho eficiente e contínuo das atividades. Os casos mais frequentes são investigações acerca dos processos licitatórios do Estado e do Município: inobservância dos princípios constitucionais pelos gestores públicos, violação de lei, malversação de verbas públicas e outros eventuais desvios de finalidade da Administração Pública, a exemplo da Improbidade Administrativa nas suas variadas formas. O Promotor de Patrimônio Público deve agir com discrição e cautela para não realizar pré julgamento ou execração pública dos investigados, não obstante, deve ser combativo e implacável na defesa do erário e da moralidade administrativa.
AIDC: Relate um pouco sobre os fatos que considera marcantes na sua carreira de Promotor de Justiça.
Na minha carreira, o atual momento na 77ª Promotoria de Defesa do Patromônio Público: está sendo muito gratificante a prestação desse serviço à sociedade e muito tenho a realizar neste Órgão. Ressalto que o período que estive Presidente da AAMP foi também muito importante, momento em que representei a classe ministerial do Amazonas no Congresso Nacional durante o advento da discussão e aprovação da Emenda Constitucional 45. Igualmente importante foi o período em que fui Subprocuradpr-Geral para Assuntos Administrativos, na qualidade de Gestor de nossa instituição, o aprendizado foi fantástico.
AIDC: Como vê a atuação do Ministério Público no cenário brasileiro e amazonense?
Vejo que o Ministério Público está dando efetividade ao que estabeleceu o legislador Constituinte, na defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos direitos indisponíveis da sociedade. É evidente que as demandas sociais são infinitamente superiores à capacidade de atendimento do MP, mas a dedicação e o esforço pessoal de seus membros, seja individualmente seja em grupo, tem colocado o Ministério Público em evidência no cenário politico do Estado e nacionalmente.
AIDC: A que atribui a credibilidade que o MP-AM tem hoje?
A qualificação técnica de seus agentes, A atuação combativa e a postura pública dos Promotores e Procuradores de Justiça e o perfil austero e uno do MP, desenhado pela Constituição Federal, colocaram a instituição no mais alto grau de credibilidade no cenário nacional.
"O Ministério Público de forma isolada não logrará êxito na minoração ou resolução dos problemas sociais por ele enfrentados. É importante a busca de parcerias institucionais, o controle das vaidades exacerbadas e a unidade efetiva dos órgão que formam a instituição" - Edilson Queiroz.
Entrevista com o Promotor de Justiça Davi Câmara
"A Lei Maria da Penha é vista como ação positiva do nosso Estado no escopo de modificar o comportamento machista de o homem brasileiro pensar que tem direito de propriedade sobre sua companheira e que pode agredi-la fisica, moral ou psicologicamente, todas as vezes que assim desejar. Para tanto, recrudesceu o rigor processual, impedindo a concessão dos benefícios da transação penal e da suspensão condicional do processo e impossibilitando de a vítima se retratar da representação em situação de lesão corporal.Uma das críticas a essa legislação é que a proteção da mulher não foi alcançada integralmente, pois a lei só pode ser aplicada quando a violência ocorre no âmbito doméstico, familiar e afetivo da vítima, portanto, se a mulher é agredida por um estranho, vizinho ou no trabalho, tais agressores estão sujeitos ao trâmite processual dos juizados especiais criminais, podendo ser beneficiados pela transação penal, retratação da representação, sursis processual, etc" (Davi Câmara)
AIDC - Fale um pouco sobre sua trajetória jurídica. Em que momento surgiu a vontade em ingressar no MP?
Cursei a Faculdade de Direito na Universidade Federal do Amazonas, no antigo prédio localizado na escadaria dos Remédios, colando grau em 1992. Logo após, fiz minha primeira pós-graduação com uma turma repleta de promotores de justiça e com poucos advogados. Os debates jurídicos eram intensos e passei a conhecer melhor as atribuições ministeriais através dos exemplos de ilustres membros: Drs. Públio Caio, Sérgio Medeiros, Carlos Lélio, Elvys de Paula, Suzete, Jussara Pordeus, dentre outros, e eles me instigaram a fazer o concurso para ingresso no MP no ano de 1995. Mas os grandes mentores e incentivadores que fizeram eu decidir pela carreira do MP foram, sem dúvida, Dr. Luiz Felipe Verçosa e Dra. Marlene Verçosa, Procurador de Justiça e Juíza de Direito. Ele convidava-me a acompanhá-lo até o seu escritório e lá discorria por horas sobre a relevância do trabalho do Ministério Público. Enquanto que ela sempre me ensinava da importância da materialização da justiça nos julgados das ações, sendo que para isso acontecer, as partes deviam atuar com lealdade e honestidade nos autos. Sou muito grato aos dois pelo promotor de justiça que sou hoje.
AIDC - Quais as Comarcas pelas quais já passou e quais os casos mais frequentes que pode citar?
Tomei posse no MP em fevereiro de 1996 e fui promovido para a capital em agosto de 2011, portanto, foram 15 anos, 5 meses e 22 dias exercendo as atividades ministeriais no interior do Estado, nos seguintes municípios, juntos aos nominados magistrados:
Fonte Boa – Dra. Etelvina Braga;
Jutaí – Dr. Joaquim Almeida;
Tefé – Dr. Taketomi e Dra. Jaci;
Coari – Dra. Maria Berenice;
Urucará – Dr. Bismarque Leite, Dr. Marcos Maciel e Dr. Onildo;
São Sebastião do Uatumã – Dr. Bismarque Leite;
Itapiranga – Dra. Patrícia Chacon;
Silves – Dr. Julião;
Carauari – Dr. Takeda;
Guajará – Dr. Carlos Zamith e Dr. Odílio;
Ipixuna – Dr. Carlos Zamith e Dr. Odílio;
Boca do Acre – Dra. Rosa Calderaro e Dr. Reyson;
Novo Airão – Dr. Anésio Pinheiro;
Iranduba – Dra. Lídia Frota, Dra. Luciana Nasser, Dr. Jean Carlos; Dr. Fábio Alfaia;
Caapiranga – Dra. Margareth;
Anori – Dr. Antônio Carlos Marinho;
Rio Preto da Eva – Dr. Roger e Dr. Cássio.
Justiça Itinerante do Interior – Dr. Luís Cláudio Chaves.
Portanto, foram 18 municípios e 25 magistrados, e de várias lembranças desse tempo, destaco a minha primeira viagem para a Comarca de Fonte Boa (1996), logo após minha posse no cargo, saindo de barco de linha (recreio) de Tefé, com uma bagagem cheia de livros, uma ansiedade sobre o que me aguardava e uma vontade de trabalhar muito e fazer a Justiça se concretizar naquele local. Durante o percurso, olhando as casas de palafitas ao longo do rio, com lamparinas e velas acesas, a garotada dentro das canoas esperando o banzeiro do barco chegar, as mulheres grávidas e seus inúmeros filhos a acenar, notando as inúmeras paradas do motor para entrega de correspondências e mantimentos aos ribeirinhos, foi que percebi que, mais que o Direito, com suas abundantes legislações, esse povo precisava era de Cidadania e a Justiça era apenas um dos expoentes que eu poderia proporcionar com meu mister.
Desde então, o significado de promotor de justiça se tornou para mim, não apenas um operador de direito munido de conhecimentos jurídicos, responsável por promover exclusivamente a ação penal pública incondicionada e outras atribuições lhe conferidas por lei, mas de um agente público do Estado com o sacerdócio de defender os interesses e direitos irrenunciáveis da sociedade e dos cidadãos.
AIDC – Quais os pontos positivos e as dificuldades de ser Promotor do interior do Estado?
O aspecto positivo é o da proximidade com os jurisdicionados e o de perceber que o homem do interior do Estado ainda nutre um grande respeito pelas autoridades constituídas. Nós somos promotores de justiça 24 horas por dia. Seja no fórum, no gabinete da Promotoria de Justiça, na mercearia, no hotel, na feira, no restaurante, na igreja, ou transitando na rua, as pessoas dos pequenos e médios municípios do interior nos veem como membros ministeriais e por isso nosso comportamento social deve ser reto, íntegro, pois serve como modelo para a comunidade.
A maior das dificuldades é a grande distância das Comarcas da Capital do Estado, cujo transporte por barco é bastante longo e, quando munidos de linhas aéreas, as passagens são caras e muitas com serviços apenas de pequenas aeronaves, o que acaba isolando o membro ministerial no município. Deste modo, muitas vezes, diante de graves situações ou de complexos problemas, o órgão do Ministério Público se sente só no combate aos crimes, às mazelas e aos “poderosos”locais.
AIDC - Fale um pouco sobre a Promotoria da Vara Maria da Penha. Quais são as dificuldades e os pontos positivos?
Quando assumi a titularidade da 73ª Promotoria de Justiça junto à Vara Maria da Penha da Capital fui surpreendido com um volume muito grande de processos com vistas ao MP (3.984), o que levou a um desdobramento de esforços de vários colegas promotores, assessores jurídicos, formando grupos de trabalhos com o intuito de normalizar essa demanda processual, fato que ocorreu no mês de setembro deste ano, com o apoio total da Administração Superior do Ministério Público. A Lei nº11.340/06, que trata da violência doméstica e familiar contra a mulher, por ser relativamente nova no mundo jurídico e trazer novidades processuais, tais como o hibridismo de aspectos cíveis e criminais, as medidas protetivas de urgência e a inaplicabilidade de institutos consagrados na Lei 9.099/95, foi alvo de diversas interpretações jurídicas e contemplou variados entendimentos jurisprudenciais em todo o Brasil.
Apenas em fevereiro deste ano, com o julgamento de duas ações no STF (ADC 19 e ADI 4424) é que foram pacificadas as questões da inaplicabilidade dos institutos da Lei 9.099/95 (sursis processual, necessidade da representação da ofendida no caso de lesão corporal de natureza leve) e da natureza da ação penal ser pública incondicionada nas hipóteses de lesão corporal. Mas outros relevantes questionamentos ainda transitam nas esferas judiciais, tais como, a natureza jurídica das medidas protetivas de urgência (cível ou penal), a possibilidade da conversão da pena privativa de liberdade em restritiva de direito nos casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, a duração das mpus, etc.
A Lei Maria da Penha é vista como ação positiva do nosso Estado no escopo de modificar o comportamento machista de o homem brasileiro pensar que tem direito de propriedade sobre sua companheira e que pode agredi-la fisica, moral ou psicologicamente, todas as vezes que assim desejar. Para tanto, recrudesceu o rigor processual, impedindo a concessão dos benefícios da transação penal e da suspensão condicional do processo e impossibilitando de a vítima se retratar da representação em situação de lesão corporal. Uma das críticas a essa legislação é que a proteção da mulher não foi alcançada integralmente, pois a lei só pode ser aplicada quando a violência ocorre no âmbito doméstico, familiar e afetivo da vítima, portanto, se a mulher é agredida por um estranho, vizinho ou no trabalho, tais agressores estão sujeitos ao trâmite processual dos juizados especiais criminais, podendo ser beneficiados pela transação penal, retratação da representação, sursis processual, etc.
Ainda, há de se definir pacificamente na jurisprudência pátria o que se entende por violência doméstica e familiar contra a mulher baseada no gênero. Por exemplo, se uma mãe ou irmã ou companheira agridem a filha ou a irmã ou a outra companheira, respectivamente, estariam elas sujeitas aos rigores da Lei Maria da Penha, sendo essa agressão baseada no gênero? Por estarmos lidando diariamente com todos esses questionamentos e evolução dos julgados dos diversos órgãos julgadores dos estados brasileiros, torna-se emocionante o desafio da sustentação das teses jurídicas sobre esses temas. Nas reuniões nacionais dos promotores de justiça atuantes junto às varas da violência doméstica e familiar contra a mulher de todos os ministérios públicos dos estados, torna-se evidente que a sociedade brasileira anseia por uma atuação constante, firme, corajosa e dinâmica dos membros ministeriais na defesa da mulher ofendida e na garantia de seus direitos, resultando na punição rigorosa do homem-agressor.
A 73ª Promotoria de Justiça está instalada numa pequena sala do Fórum Azarias Menescal de Vasconcelos, na avenida Grande Circular, na Zona Leste, dividindo o espaço com a 45ª PJ e a 75ª PJ, estando, portanto, 3 promotores de justiça, 3 agentes técnicos jurídicos e 1 estagiária trabalhando em ritmo de “lan-house”. Essa falta de estrutura física dificulta a prestação de um bom atendimento às vítimas de violência doméstica e familiar, bem como aos advogados e ao público, em geral, sendo esse problema minimizado pela excelente harmonia das relações de todos os envolvidos.
AIDC – No seu ponto de vista, quais as contribuições do Ministério Público Estadual para a sociedade amazonense?
Dentre muitas instituições brasileiras, o Ministério Público Brasileiro tem sido visto pela sociedade com respeito e credibilidade, decorrente da atuação impessoal, imparcial e apoiada nos mandamentos legais de seus órgãos, na defesa da ordem jurídica, da democracia e dos interesses indisponíveis dos cidadãos e da sociedade. Desde a promulgação da Constituição da República de 1988, o MP tem-se consagrado como o advogado da sociedade, sendo-lhe sempre atribuídos as mais diversas e importantes incumbências no resguardo desses direitos.
Nessa mesma ótica, nosso Ministério Público do Amazonas, nos últimos anos, através de seus membros, tem incessante e corajosamente agido, quando notada alguma ofensa aos valores constitucionais incrustados no Estado Democrático de Direito, sem bazófias, sem se apequenar ou amedrontar diante de poderosos, econômica ou politicamente, ou de quaisquer criminosos. Essa postura ministerial adotada por todos os seus membros, seja com atuação nas longínquas Comarcas de Envira, Boca do Acre, Ipixuna, etc., ou em Manaus, é a responsável pela confiabilidade depositada pela sociedade amazonense em nossa Instituição.
AIDC – Como a senhor avalia a atual Administração do Ministério Público do Amazonas
O Dr. Francisco Cruz, atual PGJ, reconduzido pelos votos da maioria da classe, respeitada essa manifestação pelo Governador do Estado, tem norteado sua administração com a aplicação dos princípios éticos e morais que sempre o acompanharam durante sua trajetória de membro ministerial, valorizando meritoriamente a antiguidade dos promotores de justiça nos seus votos como Presidente do Conselho Superior do MP nas remoções e promoções, bem como tem direcionado esforços para a contratação e valorização de servidores, indispensáveis aos promotores de justiça para a célere prestação de suas funções para a sociedade. Ainda tem se voltado a guarnecer os promotores de 1ª entrância e da capital com estrutura física condigna, abandonando a ideia da necessidade de o órgão ministerial ficar sujeito à concessão de um espaço dentro dos fóruns pela boa vontade dos membros do poder judiciário.
AIDC - Existem aspectos em que o Ministério Público deve melhorar? Se sim, em quais?
Acredito que nossa Instituição não deve se esquecer da imprescindibilidade da valoração intelectual de seus membros, oportunizando a todos oportunidades em participação de eventos locais e nacionais, bem como a realização de cursos de especialização e atualização, através do CEAF. Em um mundo globalizado e diante de uma união nunca antes vivenciada por todos os Ministérios Públicos Brasileiros (Estados, República, Trabalho), o intercâmbio de informações é extremamente necessário, pois além de aprimorar o desenvolvimento do conhecimento jurídico, facilita a adoção de medidas já experimentadas e bem sucedidas por colegas de outros Estados, levando à otimização da prestação das atribuições ministeriais para todos.
AIDC - Que mensagem deixa para os que pretendem ingressar na carreira do Ministério Público?
Para aqueles que sonham em servir à sociedade, agindo com impessoalidade, honestidade, imparcialidade e motivado a concretizar a justiça, o Ministério Público é a casa que os aguarda. Devem, entretanto, estar preparados para, eventualmente, serem perseguidos, ameaçados e odiados por aqueles que agem em desconformidade com o ordenamento jurídico, voltados ao mundo do crime.
E, algumas vezes, poderão até sofrer injustiças. Mas, se contaminados pelo espírito ministerial de nunca arrefecer durante a missão de promover a distribuição da justiça social, fiscalizando o fiel cumprimento das leis, defendendo os consagrados direitos constitucionais das pessoas e da sociedade, lutando em prol dos mais humildes, cada pequena vitória da justiça, cada singelo sorriso devolvido como gratidão, cada mínima paz social alcançada, servirão como bálsamos às desilusões padecidas e como fortificantes para as lutas vindouras, renovando-se continuamente a esperança de que o amanhã celebrará uma sociedade mais justa.
"Ser promotor de justiça é o sacerdócio de estar sempre servindo a sociedade, em busca da concretização do ideal da justiça humana", Davi Câmara
Entrevista com o Promotor de Justiça Antônio José Mancilha
"É indispensável que o MP-AM busque atingir essas e outras políticas públicas de forma coordenada e uniforme com o fim de atingir as metas propostas e por fim, demonstrar os resultados de suas ações. Não há mais espaços para caminhos isolados sem foco institucional. É necessário firmeza, bons propósitos, espírito público e coragem para enfrentar esses desafios", Promotor Antônio José Mancilha.
AIDC: Como surgiu a vontade de ingressar na carreira jurídica? Em que ano ingressou no Ministério Público do Estado do Amazonas?
Antônio Mancilha: No que se refere a escolha da carreira, em parte, se deu pelo fato de ter iniciado minhas atividades laborais no Tribunal de Contas da União, onde por longo anos desempenhei atividades que estavam voltadas para o conhecimento das ciências jurídicas, mas não só, uma vez que aquele graduado órgão também desenvolve tarefas que demandam conhecimento no campo das ciências contábeis, econômicas, de administração e fundamentalmente na área de técnicas financeira, orçamentária e patrimonial. A partir das opções já demonstradas, inclinei-me àquela que me oportunizaria mais chances no mercado de trabalho, tanto do ponto de vista institucional a que estava vinculado como também a do mercado externo. Esse norte baseava-se na minha necessidade premente de buscar maiores rendimentos para ajudar os meus familiares e ao mesmo tempo satisfazer uma vontade pessoal que era lidar com as letras jurídicas, fonte natural de defesa e promoção de justiça social. Formado na Universidade Federal do Amazonas, desempenhei minhas atividades além da Corte de Contas também no exercício da advocacia, relevando que esta última atividade somatizou a minha inserção aos quadros funcionais do combativo Ministério Público do Estado do Amazonas, a partir de 09 de fevereiro de 1996.
AIDC: Como foi sua passagem pelas comarcas? Há alguma lembrança que deixou saudades?
No MP-AM, após o estágio de adaptação na Capital onde desempenhei inicialmente o mister junto as várias promotorias de justiça, cíveis e criminais fui por fim, lotado na distante comarca de Atalaia do Norte na região do Alto Solimões, onde como titular permaneci até o ano de 2003. Nesse lapso de tempo, refiro-me a data da posse e exercício na comarca de origem, atuei também por designação em várias outras comarcas, a exemplos de Benjamin Constant, Tabatinga, Fonte Boa, São Paulo de Olivença, Tapauá, Carauari, Iranduba, Novo Airão, Caapiranga, Anori, Nhamundá e Guajará, além de ter participado em quatro (04) oportunidades da caravana interiorana nos Municípios de Manacapuru, (02) duas vezes, Caapiranga e Manaus, uma cada, cujo objeto principal tinham entre outros propiciar as pessoas o direito ao primeiro registro civil de nascimento. A partir de maio de 2003 fui promovido pelo critério de merecimento a Comarca de Anamã, onde fiquei como titular até 30 de outubro de 2008, quando também por merecimento, fui promovido para a Capital para atuar perante a 60ª Promotoria de Justiça Especializada no Controle Externo na Atividade Policial. Por fim, por remoção, a partir de 07 de junho de 2010, fui promovido também por merecimento para a 57ª Promotoria de Justiça Especializada na Proteção e Defesa dos Direitos do Cidadão, local onde atualmente desempenho minhas atividades laborais.
Quanto as lembranças e saudades são muitas, mas coleciono a título de resposta apenas duas. A primeira lembrança é da falta do contato pessoal dos interioranos com a figura do promotor de justiça. No interior, diferentemente da Capital, as pessoas veem no agente ministerial, alguém que possa resolver todos os seus conflitos de interesse, e estes se alinham a toda ordem. O representante ministerial deve está atento a esta demanda do povo, sem contudo se afastar do foco institucional. Lembro-me em Atalaia do Norte do carinho das pessoas comigo, fato aliás, modestamente, também verificado entre outras comarcas. Mas, naquela localidade especialmente durante o meu café da manhã era sempre presente alguma pessoa comum do povo, e não raro, trazendo frutas e outras guloseimas para mim. Num desses dias, precisamente naquele em que deveria retornar a cidade de Manaus, o vigia do prédio onde morava trouxe-me um pacote de goma (derivado de mandioca de cor branca), que pretendia que eu levasse para meus familiares. Gentilmente, agradeci a oferta e disse-lhe que morávamos numa região onde o tráfico de entorpecente era muito presente, e por certo, no aeroporto da cidade de Tabatinga, para onde deveria ir poderiam confundir referida substancia como algo ilícito. Na região do Alto Solimões a influência do tráfico de entorpecentes até hoje é muita intensa. Não raras vezes, tive que promover pelo arquivamento de inquéritos policiais sobre crimes de homicídios, que em a princípio atribuídos aos silvícolas da tribo denominado korubus (civilização que até 1999 não havia registro de contato com os chamados de civilização branca), e portanto inimputáveis. A questão fática residia na particularidade do modus operandi dos delitos cujos ferimentos das vítimas eram sempre uniformizados, quais sejam: cabeça esfacelada, vísceras expostas, subtração do fígado e, por fim, a presença ao lado da vítima, do instrumento do crime (lanças e tacapes), tudo para insinuar que o delito teria sido cometido por algum silvícola. Nesse contexto, e também em razão da notória deficiência investigativa, a exemplo da falta de uma perícia técnica de bom nível, a destinação das ocorrências sempre eram a mesma, o arquivamento.
A minha trajetória ministerial sempre foi pautada pelo respeito as pessoas indistintamente e também a instituição a que me orgulho de ser um dos seus integrantes. O Ministério Público como instituição pública defensora dos interesses sociais, da ordem jurídica e democrática sempre buscou cumprir o seu papel perante a sociedade brasileira. Os exemplos dessa efetividade se consubstanciaram a partir da CF/88, quando o órgão passou a identificar a ineficiência do Estado na realização de políticas públicas em prejuízo da sociedade. A título exemplificativo, relacionamos as questões de segurança pública, saúde, educação, urbanismo, meio ambiente, controle externo da atividade policial, infância e juventude, etc.
No âmbito local essa busca foi incessante. A falta de estrutura histórica do MPE nas comarcas do interior nunca foi obstáculo para se alcançar esses objetivos. Há registros de enfrentamento, de apreensão e medo no exercício profissional do membro institucional, mas ressalvo, nenhuma dessas situações afastaram o ímpeto e a coragem de seus integrantes em buscar a verdade, mesmo quando estas atingiram direta ou indiretamente algum de seus integrantes.
Assim a avaliação positiva, tem dois momentos, o primeiro quando com pouca estrutura tanto na Capital e Interior, buscou-se sempre o bem comum social, ora judicializando as ações ora com resoluções extrajudiciais. Outra quando a partir de 1999, salvo engano, adquiriu nova estrutura funcional na Capital oportunizando melhores condições de trabalho. Registre-se ainda o avanço com a contratação de mais promotores de justiça, servidores, equipamentos e o alcance de parte de algumas políticas públicas, a exemplo pontual na área do meio ambiente e cidadania.
É forçoso entretanto reconhecer que a ausência nos anos passados de um plano estratégico institucional poderia ter trazidos resultados mais
Nesse cenário, identificamos no Poder público a contumaz prática dos processos seletivos em detrimento do concurso público, a utilização de professores ministrando aulas em dissonância com sua formação profissional, contratos de bens imóveis particulares para fins escolares sem a mínima condição de funcionamento; precários serviços de atendimento a saúde, notadamente pela ausência de profissionais médicos, a exemplo dos programas de saúde da família, não priorização do ensino fundamental em detrimento da institucionalização do bolsa universidade, espaços públicos de feiras, mercados, e de lazer ocupados sem licitação pública, enfim, um verdadeiro corolário de atividades irregulares.
É indispensável que o MP-AM, busque atingir essas e outras políticas públicas de forma coordenada e uniforme com o fim de atingir as metas propostas e por fim, demonstrar os resultados de suas ações. Não há mais espaços para caminhos isolados sem foco institucional. É necessário firmeza, bons propósitos, espírito público e coragem para enfrentar esses desafios.
AIDC: Qual é a função do Promotor de Justiça que atua na Defesa dos Direitos Constitucionais do Cidadão?
Quando se fala em defesa dos direitos do cidadão, se entenda também a proteção deste a luz da CF e outras normas infraconstitucionais. O Ministério Público ao focar através dos seus órgãos de execução esta nobre tarefa o fez ao ditame da novel ordem fundamental, qual seja, o de fiscalizar através dos meios jurídicos disponíveis, o devido respeito aos cidadãos independente de sua cor, raça, religião, opção sexual, o direito a vida, saúde, educação, segurança, etc. Nessa linha, deve o promotor de justiça garantir os direitos coletivos, difusos e aqueles individuais indisponíveis e homogêneos.
AIDC: E hoje, qual o trabalho da sua Promotoria?
Exatamente garantir através dos meios disponíveis juridicamente a defesa coletiva, difusa e também do direito individual indisponível e homogêneo. Esta ação se dá através dos mecanismos de investigação decorrente de denúncias recebidas através do sistema on-line, diretamente através do CAPS e também ex ofício.
AIDC: Acredita que houve uma evolução do Ministério Público nesse tempo de atuação como Promotor de Justiça?
Não há dúvida que houve muitos avanços. O Ministério Público brasileiro a partir da Carta de 1988, mudou o seu perfil de atuação, passando da trincheira de acusador sistemático da ação penal, para o garantidor do implemento das políticas públicas, e neste particular, dependendo de outras nuances teve melhor ou maior atuação. É notório o combate a corrupção, ao crime organizado e a ausência de políticas públicas. O Ministério Público também se organizou institucionalmente com a criação do Conselho Nacional do Ministério Público e suas instituições associativas, a exemplo da CONAMP e CNPG e associações estaduais. Há contudo espaço ainda para se expandir notadamente na parte de estratégia. É visível ainda que não temos um plano institucional a nível nacional que direcione as políticas no âmbito ministerial. Reconheço que houve avanços pontuais, mais ainda é incipiente, e há gargalos a exemplo do controle externo da atividade policial. Esta atividade pode e deve ser compreendida não só como instrumento de interação e cooperação com as polícias, mas, data vênia, o órgão de execução do controle externo da atividade policial, deve e pode, ser instrumento com capacidade postulatória para defender o plano estratégico de segurança pública, do controle interno das polícias, do aparelhamento de suas politicas técnicas e científicas, enfim, de inúmeras outras metas que hoje estão a mercê do administrador de plantão.
AIDC: Qual dica daria para quem quer seguir carreira no Ministério Público?
Ter vocação para defender os interesses sociais, perseverança e espirito público aos desafios institucionais.