PMs e ex-PM são condenados a 37 anos e seis meses por duplo homicídio

P1010494-  Julgamento Policiais - editada

Os policiais militares João Alves da Silva, Lúcio Magno de Souza Rodrigues, Reinaldo da Costa dos Santos e o ex-PM Marcos Paulo Ferreira de Araújo foram condenados, na madrugada de hoje, após 15 horas de julgamento, a 37 anos e seis meses pelo duplo assassinato de  Gabriel da Silva Ribeiro e Luiz Fernando Gonçalves Neves, ocorrido em  no dia 15 de junho de 2007. As duas vítimas, conforme a denúncia do Ministério Público do Estado do Amazonas (MP-AM), eram suspeitas de praticar pequenos furtos e, para a Justiça do Amazonas, que aceitou a tese do MP-AM, eles foram mortos pelos policiais por terem furtado os pneus de um veículo de propriedade de Orivaldo Ribeiro Pantoja, dono de uma lanchonete em uma faculdade particular da Zona Centro-Sul de Manaus.

O julgamento começou com atraso, por volta de 14h de ontem e terminou aproximadamente 1h40. De acordo com o Promotor de Justiça Edinaldo Medeiros, que atua junto ao 2º Tribunal do Júri da Capital, onde o processo foi julgado, os réus vão recorrer da sentença em liberdade. Os quatro já estavam em liberdade quando foram julgados. Um deles, Marcos Paulo Araújo, foi excluído da corporação ao final do Inquérito Policial Militar aberto pela PMAM para apurar o duplo homicídio.

O Promotor de Justiça disse, na denúncia feita à Justiça, que os policiais e o ex-PM, que eram lotados, na época do crime, nas Rondas Ostensivas Cândido Mariano (Rocam), agiram como “justiceiros” contra as duas vítimas. Edinaldo Medeiros falou do julgamento demorado, mas se disse satisfeito com o resultado. “Foram 15 (quinze) horas de julgamento, foi cansativo mas o resultado foi satisfatório”, afirmou.

Falta de testemunhas gerou atraso

O atraso no início do julgamento, que estava marcado para as 9h, se deu por conta da ausência de quatro testemunhas de acusação que foram arroladas pela Promotoria de Justiça. O juiz do 2º TJC, Anésio Rocha Pinheiro, teve de determinar que quatro equipes formadas por oficiais de justiça e policiais militares saíssem à procura das testemunhas e as conduzissem até o Plenário do Tribunal do Júri, localizado no Fórum Henoch Reis, bairro Aleixo, Zona Centro-Sul de Manaus, onde ocorreu o julgamento. “Se acaso não encontrarem as testemunhas, o julgamento ocorrerá da mesma forma. Isso já foi decidido”, afirmou o Promotor de Justiça Edinaldo Medeiros, na manhã de ontem, antes do início do julgamento.

Das quatro testemunhas, três foram encontradas e conduzidas até o Fórum Henoch Reis. A quarta pessoa não reside mais em Manaus.

Apenas com a chegada das três pessoas ao Fórum, por volta de 14h, começou, enfim, o julgamento. Além de Orivaldo Pantoja, o homem que teve os pneus furtados, foram encontradas uma amiga da família de uma das vítimas e a esposa de Luiz Fernando Gonçalves Neves. Orivaldo, conforme a denúncia do MP-AM, levou os policiais até Gabriel Ribeiro, que foi abordado e colocado na viatura de prefixo PM-22-1409, onde estavam os quatro policiais.

Após localizarem e deterem Gabriel Ribeiro, os policiais saíram com a viatura até a casa de Luiz Fernando, de onde ele foi tirado, “à força, com chutes e pontapés, sendo também colocado no xadrez da viatura”, como está escrito na denúncia do MP-AM.

O Promotor de Justiça disse que Gabriel foi morto por espancamento. Ele teve o pescoço quebrado. Já Luiz Fernando foi executado com um tiro na cabeça.

24.06julgamento

Viúva reconhece maior parte dos réus

A esposa de Luiz Fernando foi a primeira a depor, logo após aberto o julgamento. Tanto ela quanto as duas outras testemunhas aceitaram participar da sessão usando toga e balaclava para esconder o rosto e qualquer característica física que pudesse levar às suas identificações. Diante do juiz, do Promotor de Justiça, dos advogados de Defesa dos réus, do corpo de jurados e da plateia, a viúva narrou o acontecido, reconheceu os policiais militares João Alves da Silva, Lúcio Magno de Souza Rodrigues e o ex-PM Marcos Paulo Ferreira de Araújo, como sendo os policiais que invadiram a casa dela, na noite do dia 15 de junho de 2007, e levaram o marido dela. “Se não fosse eu pegar uma bermuda para ele, eles o teriam levado totalmente despido”, afirmou a mulher.

O Promotor de Justiça Edinaldo Medeiros questionou a mulher de Luiz Fernando se, em algum momento, os policiais chegaram a pedir os documentos de identificação do marido dela. A viúva disse que em nenhum momento foi abordada pelos policiais neste sentido. “Na condição de policiais, os acusados deveriam agir conforme a lei, apresentando as vítimas em uma Delegacia de Polícia para apurar o possível furto de pneus”, consta do texto da denúncia contra os réus, que sugere que, no mínimo, os policiais deveriam ter solicitado os documentos dos detidos.

O PM Reinaldo da Costa dos Santos, também réu, não foi reconhecido pela viúva de Luiz Fernando nem mesmo pela vizinha dela. Conforme o Promotor de Justiça, há registros da PMAM que dão conta de que os quatro policiais, na noite do crime, estavam montados na mesma viatura. “Por ser o motorista, ele não desceu da viatura, por isso não foi reconhecido. Apenas os demais invadiram a casa da vítima”, afirmou o Promotor. Ainda de acordo com o MP-AM, o homem que teve os pneus furtados chegou aos policiais da Rocam por intermédio do, hoje, Coronel da PM Aroldo Ribeiro, que estudava na mesma faculdade onde o homem mantinha uma lanchonete. Assim que foi furtado, Orivaldo, conforme o promotor, acionou o oficial, que acionou a equipe de policiais.

Réus depõem e negam crime

Os quatro réus do processo negaram o crime. O primeiro a depor, o PM João Alves da Silva, foi questionado pelo Promotor de Justiça se ele sabia se o proprietário da lanchonete que teve os pneus furtados chegou até eles por intermédio do Coronel PM Aroldo Ribeiro, mas ele disse desconhecer a informação. Conforme Edinaldo Medeiros, na sala da Promotoria de Justiça, que funciona dentro do Fórum Henoch Reis, João Alves e os demais réus chegaram a dizer que foram acionados pelo coronel, mas, no depoimento, disseram que estavam de serviço, quando o então tenente PM Fredson, também da Rocam, os acionou para a ocorrência. “Diante de mim, eles confirmaram que Aroldo os acionou, mas em depoimento, creio que por medo de represálias, eles negaram tudo”, disse o Promotor de Justiça Edinaldo Medeiros.

A tese da defesa dos réus era de negativa de autoria. Os PMs foram defendidos por advogados da Associação de Cabos e Soldados da Polícia Militar do Amazonas e Corpo de Bombeiros. Um dos advogados chegou a afirmar à imprensa que os policiais da Rocam eram de um grupo de elite da PM e que não atenderiam a uma ocorrência de “um simples furto”. O mesmo advogado disse ainda que os policiais, na noite do crime, participavam de uma operação onde estavam também a Polícia Civil do Amazonas e a Polícia Federal.

O ex-PM Marcos Paulo, o segundo réu a depor e que afirmou trabalhar, atualmente, como agente de portaria, também negou o crime. O Promotor de Justiça o questionou a respeito do telefonema que Orivaldo Pantoja fez ao Coronel da PM, pedindo ajuda, mas ele disse apenas “desconhecer tal informação”, nas duas vezes que foi perguntado, por insistência da Promotoria.

Marcos Paulo, conforme a defesa dele, foi excluído por intermédio de um Inquérito Policial Militar, aberto pela PM, que entendeu que, por contas da ocorrência, ele não tinha mais condições de permanecer nas fileiras da corporação.

Imagens:

Foto 2: Raphael Alves/TJAM