Entrevista com a Procuradora de Justiça Maria José Silva de Aquino
Entrevista com a Procuradora de Justiça do Ministério Público Estadual (MP-AM) Maria José Silva de Aquino, Coordenadora do Centro de Apoio Operacional CAO-PDC Patrimônio Público, Direitos Constitucionais do Cidadão e Consumidor.
AIDC: Fale um pouco sobre sua trajetória na área jurídica até ingressar no Ministério Público do Estado do Amazonas.
MJA: Eu sou da turma de 1980 da antiga Universidade do Amazonas (UA). Até 1983 fui fiscal da Secretaria de Fazenda. Em 84 fiz concurso para advogado de ofício, que hoje é o chamado defensor público. Havia duas vagas que o Estado do Amazonas abriu, na época vinculadas à Secretaria de Justiça e Cidadania, e como eu havia passado em primeiro lugar, fiquei com uma vaga trabalhando no Sistema Penitenciário. Nesse mesmo ano fiz concurso para o Ministério Público e assumi em 1985 o cargo de Promotora de Justiça, ou seja, tenho praticamente 34 anos de serviço, e, desses 34, são 26 anos no Ministério Público do Estado.
AIDC: Há quanto tempo a senhora coordena o CAO-PDC e qual a função destas Promotorias?
MJA: Estou coordenando desde o início deste ano, creio que entre o final de janeiro e o início de fevereiro. A Promotoria de Cidadania trata do Direito Constitucional do Cidadão: direito à saúde, direito ligado ao idoso, no que diz respeito à saúde pública, educação, deficientes físicos, e quase tudo que não é das outras Promotorias, ou que não pertence a uma especializada, termina indo para Promotoria do Direito do Cidadão. Tem a Promotoria do Consumidor, que é a Coordenação que trata justamente das relações de consumo, de defesa do consumidor, e também do aspecto da saúde, mas ligado já a serviços que são remunerados, como clínicas etc. E tem a Promotoria de Proteção Patrimônio Público que é justamente a defesa do erário, ou seja, qualquer lesão ao Patrimônio Público ou vinculados; lida com licitações e contratos públicos. A proteção deste patrimônio, a defesa deste patrimônio, é feito pelas Promotorias de Proteção ao Patrimônio Público. Então engloba uma grande área, do Direito Privado, que é o Direito do Consumidor, e Direito Administrativo, que é o Direito Público.
AIDC: Como a Coordenação CAO-PDC atua no Interior do Estado?
MJA: A Coordenação, como toda Coordenação que há no Ministério Público, ainda não está com um trabalho que seja efetivo junto aos Promotores de Justiça do Interior. Agora quando o Promotor de Justiça do Interior depara-se com situações vinculadas às áreas de Consumidor, Cidadania ou Patrimônio Público, o que nós fazemos é ajudar, fornecer não só orientação, mas também material.
AIDC: É difícil coordenar tantas Promotorias?
MJA: É muito difícil. Uma das dificuldades que há nesta Coordenação é o número grande de promotorias, que, além do interior, tem que dar apoio ainda às 11 promotorias da Capital. Outro fator é a diversidade de assuntos, por exemplo, a saúde pública, que é um mundo, envolve o fornecimento de medicamentos, atendimentos, desde os pronto-atendimentos às policlínicas, hospitais, e toda saúde pública em si. A educação também, que é uma questão ampla, e tudo isto também no interior. Tem a área do Consumidor que é muito extensa, e a do Patrimônio Público também, tudo o que diz respeito ao Patrimônio Público é reclamado aqui, ou seja, é uma diversidade muito grande de atendimentos. Isso, inclusive, eu acho que dificulta a coordenação, porque são áreas díspares e extensas.
AIDC: Em sua opinião qual a contribuição do Ministério Público Estadual para a sociedade amazonense?
MJA: A contribuição do Ministério Público, não só para a sociedade amazonense, mas também para o Estado Brasileiro, é imprescindível. O Ministério Público primeiro representa os direitos disponíveis da sociedade e, além de tudo, tem o dever de fiscalizar e defender esses direitos e toda a atividade pública. A questão da improbidade administrativa, que está no âmbito destas promotorias que eu coordeno, e os direitos que são essenciais do cidadão, como à saúde, educação, deficiente físico, direitos humanos, que sejam ligados a esta área, direito da infância, no aspecto segurança, ou seja, não existe Estado democrático se não houver Ministério Público atuante. E justamente ele é defensor do Estado democrático brasileiro. Na sociedade Amazonense, verificamos que ao longo da Constituição de 88 pra cá ainda não completamos trinta anos, mas verifica-se o quanto, em termos de direitos sociais, já foi efetivado pela participação do Ministério Público, que atua no âmbito administrativo, fazendo termos de atendimento de conduta, audiências públicas e orientando também. O Ministério público não só tem aquela função de perseguir, mas justamente de buscar meios para que as políticas públicas sejam efetivadas e que haja essa resposta à sociedade, para que a mesma possa usufruir dos direitos que foi dado a ela através das constituições brasileiras, especialmente a última constituição, a chamada Constituição Cidadã, porque ali foi privilegiado os direitos do cidadão.
AIDC: Fazendo uma análise desses anos de atuação no Ministério Público Estadual, a senhora acredita que o órgão já atingiu sua excelência, ou ainda precisa melhorar? Se sim, em que aspectos?
MJA: O Ministério Público precisa melhorar no aspecto estrutural, sempre passamos pela questão financeira porque não se pode melhorar nada, absolutamente nada, se os recursos financeiros não permitem isso. Então, hoje em dia, nós trabalhamos sempre no limite. Precisa haver esta melhoria. Não só do MP, mas também do Poder Judiciário e dos demais órgãos que trabalham no âmbito da Justiça. É preciso melhorar com a estrutura. Precisamos de mais estrutura nas coordenadorias. Mas isso não é porque o Procurador Geral A, B ou C deixou de agir ou se omitiu. Isto decorre porque existe todo um processo de que precisamos sempre de mais recurso financeiro. Então, quanto mais aumentam as atribuições do MP - e há um aumento sempre crescente -, de mais estrutura nós precisamos. O Ministério Público assumiu um ônus muito grande com a constituição de 88, e não só o Estado do Amazonas, como o Ministério Público Federal, passando por todas as suas divisões, como Ministério Público Federal, Ministério Público Estadual, Ministério Público do Trabalho, e todos os MPs, nos diversos aspectos. Estamos caminhando, mas chegar aos finalmente e dizer que estamos perfeitos e acabados, isso jamais vai existir. A vida é dinâmica, a sociedade e o direito são dinâmicos. Então quando se fala de direito e atuação de membros do Ministério Público, daqueles vivem e labutam na área do direito, não podemos falar que algo foi acabado, porque estamos sempre evoluindo.
AIDC: Diante de tantas promotorias coordenadas pela senhora, o número de processos é expressivo?
MJA: Bastante. Processos judiciais não são tão expressivos, mas processos administrativos é bastante, principalmente por ser onde deságuam todas as reclamações. A população quando vem ao Ministério Público é, a maioria, para a Promotoria de Cidadania. Reclama-se que a escola não tem professor, que o posto de saúde não tem médico ou que o remédio não foi fornecido, que o edital do concurso público está em desacordo com as exigências, ou alguém que passou no concurso e não foi chamado, a água ou energia elétrica que foi cortada, ou seja, todas as reclamações possíveis. É claro que algumas vezes os casos são individuais e o MP não têm legitimidade, mas temos aqui, diariamente, um Promotor de Justiça que fica no plantão e que atende e orienta. Temos o Centro de Atendimento de Triagem que é o (CETAP) com todas as reclamações possíveis. Algumas chegam a ser até engraçadas.
AIDC: Qual o balanço que a senhora faz desse tempo de atuação como Coordenadora?
MJA: Que nós precisamos melhorar. Estamos precisando mudar os critérios que têm sido utilizados, dar uma repaginada na atuação das promotorias e na própria atividade da Coordenação, que, a meu ver, ainda não está funcionando como esperado. Precisamos fazer modificações, inclusive até com algumas alterações na Lei. A nossa Lei é de 1993, e ali já estava previsto as Coordenações. De 93 pra cá temos um bom tempo. Houve atos, nesse meio tempo, do Procurador Geral, que trouxeram algumas modificações, mas precisamos de mais metodologia de trabalho. E isso fica muito a critério de cada Coordenador que assume: um faz assim, outro, quando assume, já faz de outra forma. Precisamos, até no aspecto administrativo, de manuais, que poderiam ser operacionais. Nós precisamos dessa logística operacional que ainda deixamos muito a desejar. Acho que é necessrio que se faça isto, e é uma das coisas que estou tentando fazer, até porque nós ficamos na parte do planejamento. Até você participar, elaborar uma minuta para discutir com a administração, e levar para o Procurador Geral, é um caminhar. Hoje estou aqui, amanhã será outro colega. É sempre buscando merecer a tarefa que nos é dada, da melhor maneira possível, sempre buscando este aperfeiçoamento. A Coordenação ainda não está funcionando como deveria, até porque nós também precisamos daquele aspecto estrutural, tanto material quanto de pessoal, nossos recursos humanos também estão escassos.
AIDC: Que mensagem a senhora diria aos futuros Procuradores de Justiça do Ministério Público ou os que pretendem ingressar na carreira jurídica?
MJA: Que tenha paixão pela atividade. Se não tiver paixão pelo Direito ou pela atividade de Promotor do Ministério Público será uma carreira difícil. Não se encante apenas pela estabilidade, e isso atrai muitos candidatos, devido a estabilidade. É um emprego público que tem autonomia funcional e ganha um bom vencimento, mas se não existir o amor ao Direito, disponibilidade de olhar para aqueles que nos procuram, e ver que estamos aqui por eles, que o nosso trabalho é dirigido a este cidadão, que o nosso trabalho é dirigido à população, então é melhor que procure outra coisa para fazer. Você não consegue dar o melhor de si se não tiver empatia com a atividade que você escolheu. Então é preciso amar esta atividade.